sábado, 18 de janeiro de 2014

Nascente


Hoje fui às compras. Comprei uma nascente. Muitas existem em propriedades rurais, e a elas deve-se deixar o acesso livre para quem careça água de beber. A urbanização lhes serve de ameaça e, tal como é praticada hoje, não atinge apenas o acesso à água, mas toda uma cultura de solidariedade com o outro e de relação com a terra em que se vive. A importância da nascente vai muito além do direito de propriedade, muito além do que pode ser adquirido em troca de dinheiro, muito além do que pode ser calculado em moeda de troca. A nascente tem suas próprias moedas de troca; uma delas é o tempo. Deixar perder-se a nascente, negligenciá-la, secá-la, soterrá-la são ações que exprimem o que os indivíduos fazem também consigo mesmos e com as coletividades em que se inserem. Negam a hipótese de viver no presente e no futuro. Destroem suas possibilidades de ir além de si mesmos, do valor que lhes é atribuído pelos outros e ao qual eles não têm necessariamente que se ater. Desperdiçam suas nascentes pessoais: a energia que neles brota a cada instante, e que podem fazer durar. Essa é a nascente que comprei hoje: a escolha por ser nascente, crescente, vivente, contente, presente, premente... para, só depois, morrer.

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