Hoje fui às compras. Comprei
ingresso para o prazer de ouvir alguém dizer uma poesia com humor.
“Gastei uma hora pensando em um verso que a pena não quer escrever”(1). Como
não rir dessas nossas pequenas tragédias, se bem ditas; tão mais instigantes que os dramas
cotidianos cujas piadas nada acrescentam à nossa “ignorãça”(2). A via do
humor é mesmo um dos caminhos para a consciência, mas precisa ser um humor tão
raso? “Ocupo muito de mim com o meu desconhecer”(2). Ocupar-se é diferente de
distrair-se, de evadir-se para um estado de negação. Não dá para fugir é
de arrepender-se do tempo perdido. Mas, para isso, também é preciso ter consciência.
“Fiz de mim o que não soube e o que podia fazer de mim não o fiz”(3). Mesmo
rasos, a comédia em pé, os seriados, os avatares digitais não nos eximem da
tragédia que representam. Como diz Wisnik, “diante da tragédia, não faça drama,
a tragédia é um outro gênero.”(4)
Parece-me melhor a tragédia da incerteza que
o drama da ignorância.
“Que sei eu do que serei, eu
que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a
mesma coisa que não pode haver tantos! [...]
Em todos os manicómios há
doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma
certeza, sou mais certo ou menos certo?”(3)
Notas:
A foto é do The Old Vic, teatro londrino onde diversão, cultura e civilização aninham-se em camadas. Ocupam "o mesmo ponto, sem superposição nem transparência", como diz Borges (5).
(1) ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia.
In:___. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova
Aguilar, 2002.
(4) José Miguel Wisnik, em palestra disponível em http://www.youtube.com/watch?v=jXmfFv2iEUY
(5) Jorge Luis Borges, no conto "O Aleph", disponível em http://epoca.globo.com/edic/657/657_trecho_O_Aleph.pdf