Ontem fui às compras. Comprei fatos. Fatos e enganos.
Procurando viver os dois lados da mesma moeda, fomos ao Mineirão ver o jogo
Japão x México, da Copa das Confederações. Não, não compramos ingressos, eles
nos foram dados de graça. Devido ao baixo quorum do jogo anterior em Belo
Horizonte, o estádio sob custódia da FIFA só teve a lotação de ontem, de 52690
pessoas, depois de tomada a iniciativa de distribuir ingressos para um seleto
público. Mas a verdadeira falta de graça estava só começando.
Depois de irmos à manifestação na Praça Sete de Setembro, no
centro de Belo Horizonte, pegamos o ônibus disponibilizado pela prefeitura e
rumamos para a região da Pampulha, onde fica esse estádio, recentemente
reformado para os eventos esportivos que se anunciam. Para tornar possível uma
logística razoavelmente aceitável, impressionou-nos a quantidade de pessoal
contratado, seja para organizar as filas, recolher os ingressos, verificar se
todos estavam sentados e prontos para partir. Ficamos imaginando se todos esses
recursos - financeiros e humanos - tivessem sido investidos em um sistema de transporte que pudesse se
perpetuar, através do cotidiano dos trabalhadores, para muito além das poucas
semanas em torno de campeonatos esportivos.
A quantidade de policiais posicionados para resguardar a
mínima parcela de gente que se dirigia ao estádio era proporcional à sua
postura solícita e protetora do lazer desses premiados civis. Premiados com a
alienação, diga-se de passagem. Pois nem dali, e tampouco de dentro do estádio, era possível ver o que ocorria na ala oposta do Mineirão, onde esse mesmo
número de pessoas juntava-se em protesto, como também nós o fazíamos, alguns
minutos antes, na Praça 7.
De dentro do estádio ninguém via nem ouvia nada. O monótono jogo
transcorria sem jogadas ameaçadoras e, enquanto os torcedores se enfileiravam
para pagar 9 reais por uma Brahma e 6 por uma Coca-cola, do lado de fora,
helicópteros, bombas de efeito moral, cavalarias e tropas de choque ameaçavam e agrediam os
que protestavam diante de uma dessas monumentais Embaixadas da FIFA no Brasil.
Mas entre os fatos
que trouxemos para casa ontem, há uma relíquia de que felizmente ainda não nos
abstivemos: a Declaração Universal de 10/12/1948. Proclamando
que "os direitos humanos sejam protegidos pelo Estado de Direito, para que
o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra tirania e a
opressão", ela clama para que tenhamos "condições de vida em uma
liberdade mais ampla". Os policiais que protegiam a ala sul do Mineirão,
onde entravam os "turistas", pareciam saber que essa regra é clara,
mas os da ala norte não pareciam dar-se conta de que também eles são pessoas "dotadas
de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de
fraternidade." Vale lembrar que muitos soldados nazistas também não
tiveram discernimento para dizer "não" às ordens que recebiam. Que tipo de seres
humanos são esses, afinal?p.s. O outro lado da visão pitoresca do Mineirão, que a foto acima ilustra, pode ser vista no vídeo que editamos em: http://youtu.be/2W-74fYH7Cs
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